Estamos
vivendo uma época extremamente consumista. Um período extremamente complicado,
aonde somos levados, a gastar o que temos e que não temos, sacrificando muitas
vezes a sobrevivência familiar em nome de uma modernidade, que visa tudo, menos
o bem estar da sociedade.
As
pessoas não nascem consumistas. O consumismo é uma ideologia, um hábito mental
forjado que se tornou uma das características culturais mais marcantes da
sociedade atual. Não importa o gênero, a faixa etária, a nacionalidade, a
crença ou o poder aquisitivo. Hoje, todos que são impactados pelas mídias de
massa são estimulados a consumir de modo inconsequente.
As
crianças, que vivenciam uma fase de peculiar desenvolvimento e, portanto, mais
vulneráveis que os adultos, não ficam fora dessa lógica e infelizmente sofrem
cada vez mais cedo com as graves consequências relacionadas aos excessos do
consumismo: obesidade infantil, erotização precoce, consumo precoce de tabaco e
álcool, estresse familiar, banalização da agressividade e violência, entre
outras. Nesse sentido, o consumismo infantil é uma questão urgente, de extrema
importância e interesse geral.
De
pais e educadores a agentes do mercado global, todos voltam os olhares para a
infância − os primeiros preocupados com o futuro das crianças, já os últimos
fazem crer que estão preocupados apenas com a ganância de seus negócios. Para o
mercado, antes de tudo, a criança é um consumidor em formação, consumidor de
hoje e do amanhã, e uma poderosa influência nos processos de escolha de
produtos ou serviços.
As
crianças brasileiras influenciam 80% das decisões de compra de uma família.
Carros, roupas, alimentos, eletrodomésticos, quase tudo dentro de casa tem por
trás o palpite de uma criança, salvo decisões relacionadas a planos de seguro,
combustível e produtos de limpeza que têm pouca influência dos pequenos.
No
Brasil, a publicidade na TV é a principal ferramenta do mercado para a
persuasão do público infantil, que cada vez mais cedo é chamado a participar do
universo adulto quando é diretamente exposto às complexidades das relações de
consumo sem que esteja efetivamente preparado para isso.
As
crianças são um alvo importante, não apenas porque escolhem o que seus pais
compram e são tratadas como consumidores mirins, mas também porque impactadas
desde muito jovens tendem a ser mais fiéis a marcas e ao próprio hábito
consumista que lhes é praticamente imposto.
Nada,
no meio publicitário, é deliberado sem um estudo detalhado. No entanto, a publicidade não se dirige às
crianças apenas para vender produtos infantis. Elas são assediadas pelo mercado
como eficientes promotoras de vendas de produtos direcionados também aos
adultos.
O
Ibope Mídia, que anualmente divulga os dados de investimento publicitário no
Brasil, constatou que foram movimentados cerca de R$ 112 bilhões em 2014 com
publicidade. A televisão permanece a principal mídia utilizada pela
publicidade, representando 70% do investimento. Ao cruzar essa informação com o
fato de a criança brasileira passar em média cinco horas 22 minutos e 11
segundos por dia assistindo à programação televisiva (Painel Nacional de
Televisores, Ibope 2012) é possível imaginar o impacto da publicidade na
infância.
Apesar
de toda essa força, a publicidade veiculada na televisão é apenas um dos
fatores que contribuem para o consumismo infantil. A TNS, instituto de pesquisa
que atua em mais de 70 países, divulgou dados recentemente que evidenciaram
outros fatores que influenciam as crianças brasileiras nas práticas de consumo.
Elas sentem-se mais atraídas por produtos e serviços que sejam associados a
personagens famosos, brindes, jogos e embalagens chamativas. A opinião dos
amigos também foi identificada como uma forte influência.
No
âmbito da alimentação, a publicidade é um fator que estimula a disseminação da
maior epidemia infantil da história: a obesidade. Em 2014 pesquisas, apontam que as crianças
que já têm sobrepeso aumentam em 134% o consumo de alimentos com altos teores
de sódio, gorduras trans e saturadas e açúcar, quando expostas à publicidade destes
produtos.
O
consumismo está relacionado à ideia de devorar, destruir e extinguir. Se agora,
tragédias naturais, como queimadas, furacões, inundações gigantescas, enchentes
e períodos prolongados de seca, são muito mais comuns e frequentes, é porque a
exploração irresponsável do meio ambiente prevaleceu ao longo de décadas.
Concentrar
todos os esforços no consumo é contribuir, dia após dia, para o desequilíbrio
global. O consumismo infantil, portanto, é um problema que não está ligado
apenas à educação escolar e doméstica. Embora a questão seja tratada quase
sempre como algo relacionado à esfera familiar, crianças que aprendem a
consumir de forma inconsequente e desenvolvem critérios e valores distorcidos
são de fato um problema de ordem ética, econômica e social.
Existem
projetos que, combate qualquer tipo de comunicação mercadológica dirigida às
crianças por entender que os danos causados pela lógica insustentável do
consumo irracional podem ser minorados e evitados, se efetivamente a infância
for preservada em sua essência como o tempo indispensável e fundamental para a
formação da cidadania. Indivíduos conscientes e responsáveis são a base de uma
sociedade mais justa e fraterna, que tenha a qualidade de vida não apenas como
um conceito a ser perseguido, mas uma prática a ser vivida.
Observamos
que neste contexto as crianças tem perdido o principal em sua infância, tempo
para brincar. Não se brinca mais como antigamente, esse período rico para o
desenvolvimento psicossocial, foi substituído pelo individualismo do celular,
do tablete, do notebook, dos jogos virtuais que normalmente ensinam tudo, menos
educar.
E
todo esse distanciamento da infância e aproximação do mundo adulto, de maneira
precoce é compactuado na maioria das vezes pelos próprios pais. São eles que
levam seus filhos para as lojas de eletrônicos, presenteando com os objetos
aqui mencionados, na expectativa de conviver com o moderno.
O
desafio agora é aproveitar o que o mundo moderno oferece sem perder de vista
essa fase tão importante na vida das crianças. Crescer de maneira sadia
aproveitando os recursos tecnológicos, sem perder a infância e
sustentabilidade.
VERINALDO
ENEAS DA COSTA
PROFESSOR DE FILOSOFIA.